Orlando Neves - Odes de Mitilene
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A doçura do amor ultrapassa todas as coisas.
Quem não conheceu o beijo de Cípris
não sabe distinguir, entre as flores, as rosas.
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Assumamos o corpo e o
prazer, bebamos no elmo
de bronze o vinho e os
cheiros do fogo.
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O primeiro fogo vela este claro azul
onde o coração de uma ave
é no meu corpo compasso de cadência.
Chegasse a luz e ele saberia
quão breve é a morada do sol
nas mãos abertas ao espaço,
limpo de tudo o que foi dito,
a eternidade da admirável calmado tempo para viver.
Outra é, além do fogo e do azul, da linha
turva do voo, a inocência que demora
no odor da névoa ou no olhar manso
do falcão pousado no cume
da duna. Como o pão que se come,
sob a magoada música do vento,
no rebordo de uma pedra, quando
o verão cai, entre as folhas e o pó,
tu existes como se o tempo fosse
presença pura do erro de sermos
palavra viva na terra núbil.
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E o desejo de amar e o desejo de mar
no seu mais belo canto Safo cantava.
Oh, quanto no meu coração tarda
o que o seu canto louvava.
Foto: Stig P